Já houve tempos de polícia comunitária em Porto Alegre. Nos anos 60 e 70, eram comuns os postos policiais espalhados pela cidade, assim como os brigadianos, transitando pelas ruas, conversavam com as pessoas e ajudavam-nas, fazendo parte do cenário da capital.
Não havia distinção de comunidades. Eles estavam nas ruas e nos postos policiais, em todas as comunidades enfim, pouco importando se ricas ou pobres, se centrais ou periféricas, se comerciais ou residenciais. Quem necessitasse de ajuda não precisava andar muito. Em qualquer ponto da cidade encontrava-se um policial a quem recorrer. Toda a Brigada era comunitária porque este conceito assim define qualquer polícia, afinal, ela trata com as comunidades e as integra.
Os tempos mudaram e mudou a Brigada. Os postos policiais desapareceram e os poucos brigadianos que são vistos nas ruas estão restritos às áreas comerciais e bancárias e apenas nos horários de funcionamento de tais estabelecimentos.
O conceito de polícia comunitária também se modificou. A polícia, que deveria ser comunitária na sua totalidade e tratar sem distinções todo e qualquer cidadão, dividiu-se em polícia comunitária e polícia que não é comunitária. A primeira passou a ser considerada aquela que atua nas comunidades mais necessitadas e abandonadas pelo poder público. Por esta razão, desviou-se das suas missões constitucionais para atuar também em áreas como a saúde, a assistência social e a educação, dentre outras, chegando a haver, inclusive, ênfase nestas tarefas em detrimento do que é inerente à atividade policial. Acabou substituindo órgãos especializados que deveriam estar presentes para atendê-las nestes setores. Enquanto isto, as demais comunidades que não se enquadram em tal grau de necessidade, não porque o poder público esteja presente, mas porque possuindo algum recurso suprem-se particularmente naquilo em que o Estado falha - o que não é pouco - transformaram-se em comunidades sem polícia. O policial que antigamente transitava sorridente pelas ruas e praças, independente da classe social do bairro, que conversava, cumprimentava e até discutia futebol com os moradores e os conhecia pelo nome, virou raridade, se é que ainda existe.
Nestes tempos em que novo governo se assentou no Estado, bom seria que o conceito de polícia comunitária fosse novamente revisto, para voltar ao valor de antigamente. Que a saúde, a assistência social e outras necessidades fiquem ao encargo dos órgãos ligados às respectivas áreas afins, redistribuindo-se a polícia em todos os lugares para exercer suas missões constitucionais de efetivamente proteger as comunidades indistintamente.
Quem sabe voltemos a ver novamente o brigadiano alegre e sorridente próximo de nós. E o que é mais importante, conhecê-lo e chamá-lo pelo nome.
Alberto Afonso Landa Camargo, Coronel RR da Brigada Militar; Professor. DIRETO DO AUTOR.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - A crítica do Cel Afonso revela a verdadeira face de uma política de policiamento ostensivo mascarada pela oratória dos comandos e descaso dos governantes e desmascarada pela prática e pelo descrédito da sociedade. Fala-se em policiamento comunitário, mas policiais, os moradores e comerciantes nem se conhecem. Fala-se em policiamento comunitário com a ausência do policiamento das ruas, descumprindo princípios da permanência, das relações constantes, da aproximação e do comprometimento com o local de trabalho. Fala-se em policiamento comunitário com policiais despreparados, desmotivados e executando patrulhamento motorizado de forma impessoal, em deslocamentos contínuos e sob coordenação de uma central única, sem controle do seu comandante imediato. Fala-se em policiamento comunitário como se fosse um programa midiático e sem finalidade. Quando questionados, respondem que não há efetivos para atender a demanda.
Está certo o Afonso. Deveriam voltar-se para os manuais antigos e lá poderiam verificar que constam a maioria dos princípios apregoados pelo policiamento comunitário, faltando apenas efetivos para atender as demandas nas periferias. As estratégias de policiamento ostensivo visam muito mais a repressão do que a prevenção, e priorizam mais o atendimento de ocorrências do que compromisso com a local de trabalho. Assim, a maioria dos investimentos recai sobre viaturas e mais viaturas, ao invés de valorizarem o patrulhamento a pé, o salário dos agentes policiais e efetivos suficientes, bem formados e capacitados para atender a demanda.
As consequências são evidentes:
As viaturas desaparecem...
Os salários envergonham a capacidade e o risco...
E os efetivos encolhem pelos desvios e desmotivação...
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