Taxa de homicídios em UPPs é quase 1/3 da média nacional. Índice nas favelas pacificadas é de 8,7 mortes por 100 mil habitantes, enquanto a taxa média de assassinatos do país é de 24,3 por 100 mil. Dona Marta, em Botafogo, que recebeu a 1ª Unidade de Polícia Pacificadora, não tem assassinatos há 5 anos. Chances de um assassinato são maiores em Washington e Medellín do que nas comunidades pacificadas
CARLA ROCHA, SELMA SCHMIDT E SÉRGIO RAMALHO
O GLOBO
Atualizado:8/12/13 - 9h32
Crianças brincam em uma praça do Morro Dona Marta. A situação de tranquilidade vista hoje contrasta com os tempos em que a comunidade vivia com medo, sob o domínio de traficantes de drogas Guito Moreto / Guito Moreto
RIO - Sol a pino e sensação térmica de mais de 40 graus. Para aliviar o calor, meninos tomam banho de mangueira no largo de acesso ao Morro Dona Marta. Alheios à algazarra, moradores e turistas circulam entre vielas, que lembram um labirinto. Anos atrás, a imagem seria diferente. No local onde os garotos hoje se banham havia um ponto de venda de drogas, traficantes ditavam as regras, e a lei era a do fuzil. Com a implantação da primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do Rio, a comunidade de seis mil habitantes, em Botafogo, viu a rotina de guerra mudar e há cinco anos não conta um assassinato. Nesse período, o programa de pacificação retomou territórios, onde os homicídios caíram drasticamente. Atualmente, em 29 favelas pacificadas na cidade, onde vivem 252,5 mil pessoas, há 8,7 mortes por 100 mil habitantes. O número representa menos da metade da taxa média de assassinatos do país, que é de 24,3.
Levantamento inédito feito a partir de estatísticas do Instituto de Segurança Pública (ISP) revela que em sete — Dona Marta, Chapéu Mangueira, Babilônia, Ladeira dos Tabajaras, Morro dos Cabritos, Formiga e Salgueiro — das 29 comunidades analisadas não foi registrado sequer um assassinato no ano passado. Nas outras 22 favelas, houve 22 mortes, e a tendência é de queda: foram seis a menos que em 2011. Para dar uma ideia, porque do ponto de vista estritamente técnico as comparações precisam ser entre universos semelhantes, significa dizer que hoje a chance de acontecer um assassinato nas comunidades pacificadas da cidade é menos da metade da de Washington D.C., capital dos EUA, atualmente com taxa de 19 mortes por 100 mil. Se comparada à de Medellín, é quatro vezes menor. A cidade colombiana, que foi reduto do traficante Pablo Escobar, passou por transformações, mas ainda tem taxa de 38 assassinatos por 100 mil habitantes.
— Acima de dez por 100 mil habitantes, é considerada endêmica. Até dez, a situação não é normal, mas está muito próxima da normalidade. Apenas para ilustrar, porque não são coisas semelhantes, não há no Brasil qualquer estado ou capital com taxa abaixo de 10. Estou fazendo um análise técnica, sem entrar no mérito de como foi feito o levantamento, porque não conheço a metodologia — diz o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, responsável pelo Mapa da Violência, que pesquisa a violência no país há mais de uma década.
Apesar de já terem sido implantadas 36 UPPs, que beneficiam diretamente 540,5 mil pessoas, os dados levantados pela reportagem do GLOBO junto ao ISP levam em conta apenas os registros de 18 UPPs, que abrangem 29 comunidades. Trata-se de unidades com pelo menos dois anos de existência, o que dá mais consistência à análise dos resultados. Com isso, comunidades como Rocinha, Nova Brasília, Adeus, Baiana e Alemão, além das do Complexo do Lins, recentemente ocupadas, ficaram de fora. O diretor-presidente do ISP, Paulo Augusto Souza Teixeira, garante que há uma tendência de queda nas taxas de homicídios. Para ilustrar, ele diz que no primeiro semestre deste ano só houve sete homicídios, contra 14 no mesmo período de 2012. Esses números já incluem as quatro novas áreas pacificadas: Adeus, Alemão, Baiana e Nova Brasília, totalizando 33 comunidades atendidas por UPPs.
Maria dos Anjos, de 40 anos, não entende de taxas ou estatísticas. A diarista, mãe de três filhos, cresceu no Dona Marta em pleno período de guerra entre quadrilhas. Para ela, o mais importante é poder sair de casa pela manhã sabendo que o imóvel não será invadido por bandidos enquanto estiver fora:
— Meus filhos já estão encaminhados, trabalham e cuidam de suas famílias, mas tenho um casal de netos que nunca ouviu um tiro. No passado, perdi as contas das vezes em que pedi para dormir na patroa, por não poder voltar para casa por causa dos tiros.
Para José Mariano Beltrame, secretário de Segurança do Rio, os números provam que a política de segurança está no caminho certo. O governador Sérgio Cabral acrescenta que o projeto representa o rompimento com a inércia, que por 40 anos abandonou parte do Rio.
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