EM 2006
O DIA 11/11/2006 22:07:00
Sociólogo Hugo Acero diz que é possível reverter os índices de violência com a participação de todas as esferas da sociedade e convence Sérgio Cabral a conhecer as mudanças em sua cidade Alexandre Arruda
Rio - Responsável por quase uma década pela segurança pública de uma das cidades mais violentas da América Latina, o sociólogo Hugo Acero tornou-se referência desde que reduziu a criminalidade na capital da Colômbia, Bogotá. Na sede do Instituto Viva Rio - onde deu uma aula semana passada -, o ex-subsecretário de Segurança e Convivência falou aO DIA sobre a difícil missão que assumiu em 1993, quando começou. Hoje, o homem que tem 'aço' no nome (Acero em espanhol) tornou-se observador da ONU para questões de violência e despertou a atenção do governador eleito Sérgio Cabral com os resultados obtidos em Bogotá e Medellín.
"Em 1993, a capital colombiana teve 4.352 homicídios, o que dava a taxa de 80 assassinatos por 100 mil habitantes. O Rio, por exemplo, tinha uma taxa de 56. Este ano, Bogotá vai terminar com 18 homicídios por 100 mil habitantes". A solução para a criminalidade, diz, "requer a participação de todas as esferas da sociedade".
Na capital, o prefeito à época, Antanas Muckus, reuniu, além dos secretários de Saúde, Educação e Segurança, juízes, fiscais de renda, urbanistas e outras instâncias públicas, como a procuradoria. "Não era só a polícia e a Justiça. Quantas escolas há naquele lugar? Quantas crianças temos estudando? Quantos postos de saúde temos ali? Funciona a iluminação desse bairro? Recolhe-se o lixo? Ou seja, entrávamos com todas as instituições para fazer melhorias", explicou Acero, destacando que a pasta da segurança cabe à prefeitura. A intervenção incluía demolição de barracos e a indenização dos moradores. Ele admite que a medida é dura, mas necessária."Deve-se comprar o terreno e arrebentar (o barraco) para obra pública", diz.
O dinheiro veio do aumento de impostos, prometido em campanha. Muckus criou duas taxas: uma opcional, incorporada ao IPTU, e outra telefônica, obrigatória, que aumentou o orçamento de US$ 5 milhões no biênio 1993 e 1995 para US$ 52 milhões entre 1998 e 2000. Tudo, diz Acero, para segurança e infra-estrutura.
Foram construídas unidades blindadas dentro das favelas, com efetivo policial permanente. A quantidade de agentes, porém, não aumentou. Desde aquela época, Bogotá tem 10.500 homens. "Capacitamos a polícia em convivência. Preparamos para atender o cidadão. E atender bem".
Mais mortes no Rio do que em Bogotá
Após o encontro com o sociólogo Hugo Acero, na quarta-feira, Sérgio Cabral decidiu enviar uma equipe a Bogotá para conhecer a experiência colombiana. Nos próximos quatro anos, ele terá de enfrentar um quadro dramático no estado.
Com 12 milhões de habitantes, o Rio tem um índice de 43,7 assassinatos por grupo de cem mil habitantes. A taxa oscilou muito pouco nos últimos 10 anos: em 1996 (primeiro ano com dados divulgados pelo Instituto de Segurança Pública), era de 55,4 mortes por grupo. Foram 7.435 homicídios contra 6.830 em 2005.
Para a socióloga Sílvia Ramos, pesquisadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), Bogotá pode ser uma referência de integração, mas não um modelo a ser copiado.
"Sou a favor de que haja políticas de segurança específicas para a favela, com policiamento local e maior integração. O policiamento não pode entrar e sair", diz a pesquisadora, que defende maior entrosamento entre polícia, sociedade civil organizada e governo, como no caso colombiano. Ela admite divergências entre policiais e grupos de atuação social, mas acredita que já chegou a hora de ambos os lados dialogarem. Perguntado se aceitaria o desafio do Rio, Hugo Acero deixa uma porta aberta: "Se houver compromisso do governante, aceito".
MEDELLÍN É OUTRA APÓS ESCOBAR
A América Latina tinha, nas décadas de 80 e 90, dois grandes pontos de produção de cocaína: Cáli e Medellín, na Colômbia. As duas cidades ‘disputavam’ o mercado das drogas com grupos de traficantes que chegaram a formar os temidos ‘cartéis’, que determinavam as regras do jogo mundial do tráfico. No cartel de Medellín, o principal chefão era Pablo Emilio Escobar Gaviria, morto em 1993.
Apesar da queda natural de crimes após a morte de Escobar, os índices ainda eram altos: 174 assassinatos por cem mil habitantes, em 2002, e 95, em 2003. Nos últimos três anos, Acero começou um trabalho com a prefeitura de Medellín nas favelas, as ‘comunas’, parecidas com as cariocas. Em 2005, o índice de homicídios foi de 36 por cem mil habitantes. "Em São Paulo e Vitória (nas favelas) me sentia naquela Medellín", comparou Acero.
Sobre o uso de fuzis e armas de guerras nas favelas do Rio, Acero é taxativo: "Em Medellín também tínhamos isso. Não acredita que Pablo Escobar não tinha tudo o que tem aqui? E ele era mais louco do que esses. Fez uma guerra de estado".