Em 1973 eu tinha voltado do Curso de Técnica de Ensino, no Centro de Instrução Almirante Wandenkolk, da Marinha do Brasil (frequentado na sempre saudável e agradável companhia do Eugênio Ferreira a Silva Filho, sendo que conquistamos os primeiro lugares), fora promovido a Capitão e assumira a chefia da Seção Técnica de Ensino.
A gente tinha uma “panela”, que era constituída pelo CAIRO BUENO DE CAMARGO, pelo MAURO PINTO MARQUES, pelo EURICO NUNES DE OLIVEIRA e por mim. Como referi em outras oportunidades, almoçávamos junto, na mesma mesa e costumávamos, depois do almoço e até o início do expediente da tarde, a continuar juntos, reunidos na minha sala (STE) e, ali, em conversas longas e eivadas de entusiasmo e filosofia, a alimentar o sonho de salvar o mundo através do trabalho de uma briosa Brigada.
Aquele ano de 1973 foi pródigo em realizações e “invencionices” da panela (“invencionices” por conta de uns não muito afeitos a condutas e atividades que extrapolassem o mínimo necessário...). A partir daí se planejaram e se organizaram Cursos de Especialização em Policiamento para Oficiais - em um deles, o Cairo conseguiu emprestado por uma semana um helicóptero da Esquadrão Misto de Reconhecimento e Ataque, da FAB, sediado em Santa Maria -, um Curso de Técnica de Ensino, um trabalho junto às escolas visando a melhorar o nível das futuras inscrições para os Cursos, refazimento e adequação dos currículos dos Cursos de Formação, Aperfeiçoamento e Superior, um plano para Educação para o Trânsito em âmbito Nacional, além de outras atividades, todas elas além de nossas atribuições específicas.
Estes trabalhos e atividades serão cada um tema de uma crônica, focando hoje neste o Projeto de Educação para o Trânsito para escolas.
Abrindo um parêntese, refiro que no ano de 1967, ao ser transferido de Passo Fundo para a APM (CIM na época), verifiquei que não havia a disciplina de Trânsito no CFO. Consegui com o então Ten Mauro Carvalho, que tinha cinco aulas de Polícia nas manhãs das quartas-feiras, que ele me cedesse dois tempos a cada semana e, assim, organizei a matéria TRÂNSITO. Sobre este fato também comentarei em outro dia.
Pois em relação ao projeto de educação para o trânsito, passei a trabalhar, fora do horário de expediente, diretamente com a Fundação Padre Landell de Moura e a Secretaria de Educação do Estado, tendo sido conseguido o patrocínio do Café Dínamo. Como quarta à tarde não havia expediente e eu tinha pelo menos duas delas livres por mês - pois nas outras duas havia o trabalho com as escolas em visita à APM -, trabalhava nesses horários ora na Fundação, ora na Secretaria. Estruturou-se desta forma o projeto de Educação para o Trânsito, nascendo nele a dupla PMZITO E DINIMIM (em função do café Dínamo).
Foram escritos e impressos livros da 1ª à 5ª série e o Manual do Professor e, em função das modernidades de que se dispunha à época, foram usados slides em conjunto com uma fita cassete, ambos acionados simultaneamente em um aparelho que nem lembro o nome. Assim tínhamos som e imagem do conteúdo para apresentações e aulas, com o reforço dos exercícios contidos nos livros.
Conseguimos o lançamento da campanha de dentro da Secretaria, cujo titular era um Coronel da Reserva do Exército, de nome Mauro Rodrigues (parece-se ser este o sobrenome; afinal lá se vão 47 anos). Houve na ocasião a firme promessa de implantação das aulas a partir de 1974.
Acompanhando de perto as providências para esta implantação, o Cairo e eu sentimos que não a coisa não estava andando e, ainda, havia o furo em relação às escolas municipais.
Então decidimos, ele e eu, usar nossas férias – que seriam gozadas em fevereiro de 1974 – para promover a divulgação junto a Prefeituras.
Para isto, conseguimos algum patrocínio para despesas (gasolina, alimentação e hospedagem), organizamos um roteiro, fizemos contatos com Unidades e Destacamentos e embarcamos no meu carro, um Corcel ano 1972, placa AB-9099.
Visitamos mais de 20 cidades, onde fizemos palestras, acontecidas nos mais variados horários, sempre para um bom público, graças ao prestígio dos comandantes das OPM nos centros maiores e de nossos colegas comandantes de Destacamentos nos demais.
Em cada local o público se mostrava interessado... mas não passava disso, pois dos prefeitos e seus secretários de educação o que ouvíamos era que o plano anual estava pronto e que fariam o possível para incluir no segundo semestre.
Chegamos uma tarde em Ijuí, depois do almoço, pois pela manhã havíamos falado em Cruz Alta.
O Comandante do Destacamento de Ijuí era o então Tenente Jorge Ricardo Ascenço. Fiquei feliz em revê-lo, pois tinha sido meu aluno no CFO, inclusive da matéria de Trânsito. Conversamos, visitamos o local da palestra e conseguimos que um hotel nos acolhesse naquela tarde, para banho e troca de roupa, sem pouso, pois, assim que terminada a palestra, trocaríamos o uniforme pela ”xerga” de viagem, jantaríamos e seguiríamos para Santo Ângelo, onde dormiríamos.
À noite, fomos brindados com um ótimo público presente. Prestígio do Ascenço, sem dúvida. Terminada a palestra, fomos jantar um pouco frustrados, pois não tínhamos recebido qualquer sinal de interesse por parte da administração Municipal, e dali seguimos para o hotel, onde trocamos a roupa. Já estávamos saindo quando chegam o Prefeito e o seu Secretário de Educação: “Capitão”, diz-me ele, “queremos este projeto já.” Animados, sentamos em reunião na recepção do hotel, explicamos o funcionamento, detalhamos os contatos a serem feitos com a FEPLAM e deixamos uma unidade do aparelho com fita e slides, um kit completo dos livros “As Transas de Dinimim e PMzito no Trânsito”. Despedimo-nos e, desta vez felizes, seguimos adiante.
Continuamos o périplo pelo Rio Grande e completamos a volta pelo Rio Grande.
(Não posso esquecer de falar do velho Quirino Dias, que encontramos perto de Livramento, mas, como sempre, é outra história a contar.)
De todos os municípios visitados, apenas Ijuí pôs em execução, naquele ano de 1974, o projeto de forma integral. Alguns Municípios esparsamente usaram partes do plano, sem metodologia e persistência.
Bem, como referi, era o mês de fevereiro de 1974.
Em dezembro de 1.975 pedi a minha licença prêmio, passei a gozá-la e, ao seu término, entrei em licença para tratar de interesse particular, sendo que pedi a minha demissão em outubro do ano seguinte.
Pois em 1.993, - praticamente vinte anos depois da conversa com o Prefeito de Ijuí –, eu já morando em Passo Fundo, estava na sala da minha casa, a assistir TV. Era um domingo. Na abertura do programa Fantástico, Cid Moreira, com sua voz de barítono, vai mencionando as manchetes dos assuntos que seriam ali tratados. E uma delas era: “IJUÍ, no Rio Grande do Sul: a cidade mais educada no trânsito. É Fantástico!”
Eu sorri...
Cumpria-se ali, ainda que numa minúscula parte do mundo, aquilo que uns idealistas tinham imaginado quando tiravam de suas horas de folga tempo para pensar em como melhorar o que havia a sua volta. E tal como dizíamos, quando planejávamos, a educação haveria de ser a solução para um problema como o trânsito. Levou o tempo de uma geração para que uma cidade, com um prefeito interessado, viesse a se tornar exemplo para todo o País.
Minha homenagem ao querido Eurico Nunes de Oliveira, que foi retirado de nosso convívio muito cedo e de forma brutal; meu carinho com a admiração de sempre e a saudade que só os muuuuito veteranos sabem sentir de forma dolorida e silenciosa aos valorosos Cairo Bueno de Camargo e Mauro Pinto Marques. E a minha homenagem especial a minha querida e inesquecível Academia de Policia Militar da briosa Brigada Militar.
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